Lembrar é preciso


Marlene Marques Ávila

Em outubro de 2023 visitei o Museu da Memória e dos Direitos Humanos em Santiago do Chile, equipamento construído para manter viva a memória da ditadura militar chilena. Por um determinado tempo acompanhei uma jovem professora com sua turma de alunos pré-adolescentes, ouviam atentos a história e a viam estampada nos vídeos, fotografias, documentos, textos, por meio dos quais o museu nos diz: Não devemos esquecer, mas lembrar, relembrar é prestar reverência aos que lutaram pela democracia, e reconhecer a tempo os sinais do perigo de perdê-la. Então me perguntei: Por que no Brasil não temos um museu como este?
No espaço externo do museu estava exposta a mostra “Fotoperiodismo y dictadura: Brasil 1964 / Chile 1973” do fotojornalista brasileiro Evandro Teixeira. Uma série de fotografias mostrando entre outras cenas, Santiago sitiada, a destruição do Palácio de La Moneda, a casa depredada de Pablo Neruda e a participação popular no enterro do poeta. Posteriormente, li a respeito da exposição, foi uma realização da Embaixada do Brasil por ocasião do cinquentenário da ditadura chilena em setembro de 2023. Os ministros Flávio Dino, então na pasta da Justiça e Silvio Almeida dos Direitos Humanos participaram da abertura da mostra, e naquela circunstância o ministro da justiça afirmou que os brasileiros também teriam um espaço como aquele, considerei então respondida a minha pergunta.
Contudo, os acontecimentos dos últimos dias, torna temerária a afirmativa do ex-ministro e ingênua a minha indagação. Aqui é necessário relembrar, em março de 2021, a justiça brasileira decidiu que o golpe militar de 31 de março de 1964 poderia ser comemorado. Este fato se deu no contexto de um governo de extrema direita, o qual exultou com a possibilidade de comemorar a data por ser esta um “marco da democracia”. Isto demonstra que há diferentes formas de se contar a história, assim, para quem não a viveu, nem tem acesso aos registros dos fatos, sua memória pode ser completamente distorcida.
Em 31 de março de 2024, enquanto o ex-presidente Bolsonaro comemorou o aniversário da instalação da ditadura, o presidente Lula silenciou, indo na contra mão das aspirações e esperanças que historicamente representa, as quais fez questão de ilustrar tão bem ao subir a rampa do Palácio do Planalto para assumir seu terceiro mandato como presidente da República do Brasil, rodeado por representantes de segmentos sociais tradicionalmente invisíveis ao poder público.
A memória da ditadura pertence ao povo brasileiro, rememorar o golpe militar que por duas décadas mergulhou o Brasil em um regime de recessão não significa “remoer o passado”, nem impede que o País avance, muito pelo contrário. A tentativa de golpe em oito de janeiro de 2023 expôs claramente a fragilidade de nossa democracia. É preciso honrar a história, lembrar para não retroceder!

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Marlene Marques Ávila

E-mail: marquesavilamarlene@gmail.com

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